24 de maio de 2004

O MILAGRE FICA ONDE SEMPRE ESTEVE: NO LIVRO
Como não devo favores ao Paulo Branco nem isto é um jornal onde se tem de elogiar tudo o que as suas produtoras fazem, gostaria de opinar sobre o filme de Mário Barroso, O MILAGRE SEGUNDO SALOMÉ.
O romance é maravilhoso (2 volumes, na Presença). Um dos melhores livros de José Rodrigues Miguéis, ignorado q.b. pelos nossos contemporâneos.
O filme nem por isso. Contudo, o bom trabalho de fotografia e a realização segura de muitas cenas mereceria sê-lo. Bem como o trabalho de alguns actores (Nicolau Breyner, subtil, Ana Bandeira quase sempre segura, a presença contida de Ricardo Pereira...)e a música com arranjos de Bernardo Sassetti. Destaque ainda para a direcção artística de Isabel Branco que nos dá uma Lisboa do início do século (1917-1918) requintada nos pormenores.
Este filme mereceria um argumento forte. Na minha opinião ficou muito longe de o obter. Carlos Saboga (residente em França há décadas e de quem vimos "Jaime" além de algumas intervenções em telefilmes da Sic) não domina a arte de criar uma cena, desconhece o significado de "sequência" e, sobretudo, não alinha dois diálogos de jeito. As personagens falam com uma verborreia tal que nos ficam a doer os ouvidos. E para nada, depois de espremido nada disseram. Sem querer estar a bater no ceguinho parece-me evidente que o argumentista não tem talento para arte de escrever as coisas que os actores dizem, nem domina a língua portuguesa na sua forma coloquial. Muito menos a falada em 1917 ("Olha que ela fode-te!" ou "Que seca!"...).
Repito, este filme mereceria um argumento que aguentasse a força que se desprende do trabalho de imagem.

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